O professor brasileiro
Vinicius Mariano de Carvalho, do King's College London (Inglaterra) e da
Universidade de Aarhus (Dinamarca), está na UFMG para uma série de atividades
no âmbito do programa Cátedras Fundep/Ieat.
(...)
Vinicius Mariano de Carvalho
conversou com o Portal UFMG sobre a produção literária, musical e artística
desses soldados. Para o professor – que, além de pesquisador, é regente de
orquestra –, “transdisciplinaridade é abrir fissuras em discursos
demasiadamente sólidos”.
Em meio às respostas sobre
suas pesquisas, Vinicius alertou para certa similaridade entre o cenário
contemporâneo e o que antecedeu a Segunda Guerra Mundial. “A polarização, a
intolerância, os maniqueísmos conduzem à guerra, que é o destino de um caminho
em que há a ausência de diálogo", afirma o professor.
Confira a seguir os principais
trechos da entrevista.
Os brasileiros se alinharam aos Aliados na
Segunda Guerra Mundial. Qual a real participação do Brasil nas frentes de
combate?
A história da participação
brasileira na Segunda Guerra Mundial é muito negligenciada. Costuma ser
disseminada uma visão reducionista dessa participação, como se ela se limitasse
a um pequeno grupo de soldados brasileiros que teria chegado já no fim do
conflito. Na verdade, 25 mil soldados participaram. Eram pracinhas de todas as
partes do Brasil. Houve a participação de um regimento inteiro de Minas Gerais,
de índios do Mato Grosso do Sul, de gente da Amazônia, de descendentes de
alemães do Rio Grande do Sul. Essa participação, se não era grande
proporcionalmente ao que ocorria na Europa, era grande considerando o contexto
brasileiro.
Que contribuição artística esses soldados
deixaram? Qual é o significado dessa produção?
Em diferentes partes do mundo, há estudos e referências sobre a produção artística dos soldados nas guerras – especialmente na Segunda Guerra Mundial, que, além de ter sido longa, envolveu muita gente. Em razão disso, em várias partes do mundo há livros de literatura produzidos por soldados, poesias da guerra, pinturas de artistas que foram para o campo de batalha e até mesmo músicas compostas durante o conflito, além de outras formas de arte. Eu nunca tinha visto isso ser tematicamente organizado em relação à participação brasileira. Conhecíamos as obras, mas faltava alguém se debruçar sobre essa produção em uma perspectiva temática, para estabelecer um panorama mais amplo de como os soldados brasileiros refletiram artisticamente a participação na Segunda Guerra. E é possível perceber que eles fizeram um tipo de arte que fala menos do país e mais do indivíduo – ou seja, uma arte sobre a experiência individual da guerra.
Em diferentes partes do mundo, há estudos e referências sobre a produção artística dos soldados nas guerras – especialmente na Segunda Guerra Mundial, que, além de ter sido longa, envolveu muita gente. Em razão disso, em várias partes do mundo há livros de literatura produzidos por soldados, poesias da guerra, pinturas de artistas que foram para o campo de batalha e até mesmo músicas compostas durante o conflito, além de outras formas de arte. Eu nunca tinha visto isso ser tematicamente organizado em relação à participação brasileira. Conhecíamos as obras, mas faltava alguém se debruçar sobre essa produção em uma perspectiva temática, para estabelecer um panorama mais amplo de como os soldados brasileiros refletiram artisticamente a participação na Segunda Guerra. E é possível perceber que eles fizeram um tipo de arte que fala menos do país e mais do indivíduo – ou seja, uma arte sobre a experiência individual da guerra.
(...)
A partir dessas análises, como o senhor
entende a guerra? Como aproximá-las da realidade contemporânea, do século 21?
É poética e, ao mesmo tempo,
ridícula – dramática – a ideia que Napoleão tinha de “artilharia”, que ele
chamava de "último argumento dos reis”. Napoleão vai dizer isso no sentido
de que, se você chega a optar por esse “último argumento”, é porque todos os
canais de negociação se esgotaram. Nesse sentido, a experiência da guerra é a
negação da possibilidade da negociação: é a solução não negociada para os
conflitos, uma solução para a impossibilidade de diálogo. A guerra, em si, não
é uma situação de maniqueísmo. Talvez o maniqueísmo conduza a ela. Vamos
perceber essa relação se compararmos os problemas que o mundo vive atualmente
com o contexto que antecede a Segunda Guerra Mundial. Antes da Segunda Guerra,
tínhamos muitas imagens como essa, de uma intolerância gerada por uma
incapacidade de autocrítica, uma tendência ao pensamento totalitário, que
coloca “isso é a verdade” e “isso não é a verdade”. A polarização, a
intolerância, os maniqueísmos conduzem à guerra, porque, pensando em uma linha
reta, a solução final para a intolerância é a guerra: ela é o destino de um
caminho em que há a ausência de diálogo. É nesse ponto que precisamos fazer um
“combate preventivo”, digamos assim. A guerra surge nos contextos em que as
ideias passam a valer muito pouco.
(...)
Fonte: UFMG