Lima Barreto
Correio da Noite 14-12-1914
Nos momentos em que a pátria fica a níqueis,
a Câmara e o Senado, isto é, os senhores senadores e os senhores deputados,
lembram-se logo de diminuir o número de funcionários públicos.
Não digo que se não possa fazê-lo; a tal
respeito, não tenho opinião.
Diminuí-los ou não, mesmo que eu entre no
corte, é para mim absolutamente indiferente.
Noto, porém, que as duas casas do Congresso
não se lembram, de forma alguma, do que se passa nelas.
Toda a gente sabe que a Câmara e o Senado têm
cada qual uma secretaria, um serviço de redação de debates, uma legião de
auxiliares, de contínuos e serventes, e que esse cardume de empregados aumenta de
ano para ano. Por que o Congresso não começa cortando nas respectivas
secretarias, para dar o exemplo?
Nesse ponto não se toca, não se diz nada e os
empregados do executivo são os mais culpados do déficit.
É uma verdadeira injustiça, tanto mais que os
funcionários da Câmara e do Senado têm, quase sempre, além de bons ordenados legais,
consideráveis gratificações, sob este ou aquele pretexto.
O povo diz que macaco não olha para o seu rabo; os parlamentares
só olham para os dos outros.
Não se lembram que, de quando em quando, vão
criando lugares nas suas secretarias, absolutamente desnecessários, tão-somente
para atender a impulsos de coração.
Homo
sum...
Certamente os senhores devem saber que,
antigamente, os atuais diretores de secretarias eram chamados oficiais-maiores.
Pois bem: a Câmara tem na sua secretaria um
diretor, um vice-diretor ou dois, e um oficial-maior.
Não é fácil mostrar assim o rol de empregados
em duplicata ou triplicata que há por lá. Os regulamentos não falam claro; é
preciso combiná-los com indicações, com autorizações camarárias e é trabalho que
sempre reputei e reputo enfadonho.
O Diário Oficial foi feito para não ser lido
e o Congresso não tem mais direitos a melhores atenções.
A observação aí fica, e, enquanto ela quiser
imitar qualquer das famosas “secretarias da comissão tal” legisladores extraconstitucionais
e sobremodo empertigados nas suas funções, penso, dizia, que os abnegados pais
da pátria devem meditar sobre o fato (sic).
Não é só o poder executivo o grande plantador
de sinecuras; o legislativo colabora na plantação, na colheita; e na sua
própria seara faz das suas.
Cá e lá, más fadas há; e não é a última vez
que o torto ri-se do aleijado.
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