PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

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segunda-feira, 24 de junho de 2013

TENHO ESPERANÇA QUE...



Publicado no periódico A.B.C., em  8/6/1918

Certas manhãs, quando desço de bonde para o centro da cidade, naquelas manhãs em que, no dizer do poeta, um arcanjo se levanta de dentro de nós; quando desço do subúrbio em que resido há quinze anos, vou vendo, pelo longo caminho de mais de dez quilômetros, as escolas públicas povoadas.

Em algumas, ainda surpreendo as crianças entrando e se espalhando pelos jardins à espera do começo das aulas; em outras, porém, elas já estão abancadas e debruçadas sobre aqueles livros que meus olhos não mais folhearão, nem mesmo para seguir as lições de meus filhos. Brás Cubas não transmitiu a nenhuma criatura o legado da nossa miséria; eu, porém, a transmitiria de bom grado.

Vendo todo o dia, ou quase, esse espetáculo curioso e sugestivo da vida da cidade, sempre me hei de lembrar da quantidade das meninas que, anualmente, disputam a entrada na Escola Normal desta cidade; e eu, que estou sempre disposto a troçar as pretensões feministas, fico interessado em achar no meu espírito uma solução que satisfizesse o afã do milheiro dessas candidatas a tal matrícula, procurando com isso aprender para ensinar, o quê? O curso primário, as primeiras letras a meninas e meninos pobres, no que vão gastar a sua mocidade, a sua saúde e fanar a sua beleza. Dolorosa coisa para uma moça...

A obscuridade da missão e a abnegação que ela exige cercam essas moças de um halo de heroísmo, de grandeza, de virtudes que me faz, naquelas manhãs em que sinto o arcanjo dentro da minha alma, cobrir todas elas da mais viva e extremada simpatia. Eu me lembro também da minha primeira década de vida, de meu primeiro colégio público municipal, na Rua do Resende, das suas duas salas de aula, daquelas grandes e pesadas carteiras do tempo e, sobretudo, da minha professora – Dona Teresa Pimentel do Amaral – de quem, talvez se a desgraça, um dia, enfraquecer-me a memória, não me esqueça de todo.
(...)
Lima Barreto

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